...são leitores de segunda?" Autor do romance "E Se Fosse Verdade" concede entrevista a LV.
Tenho 44 anos. Nasci nos arredores de Paris, vivi na Califórnia e hoje moro em Londres. Sou autor de romances. Estou casado e tenho um filho, Louis (16 anos). Não tenho partido, sou um social-liberal, de centro: sou libra... Não tenho religião, mas tenho fé. Quando um livro tem muitos leitores, os críticos desconfiam! La Vanguardia - Me contaram que já vendeu 5 milhões de livros...
Marc Levy - Bem... já são oito.
LV - E qual é o segredo? Levy - Não sei.
LV - Talvez um bom marketing. Levy - Com marketing você pode vender 70 mil exemplares de um disco, um livro ou um filme. Mas o resto depende da própria obra.
LV - O que você conta em seus romances? Levy - Que o único limite para nossos sonhos é o que impomos a nosso próprio desejo de que eles se tornem realidade.
LV - Parece muito americano... Levy - A América foi um sonho europeu.
LV - Acredita realmente nos sonhos? Levy - Muitas pessoas nos dizem todos os dias: "O que você deseja é impossível". Talvez precisemos que alguém nos diga outra coisa!
LV - Qual foi o primeiro sonho de sua vida? Levy - Ser médico. Queria ajudar as pessoas... mas era muito ruim em matemática e isso me fechou esse caminho... Que absurdo!
LV - Então começou a escrever.... Levy - Não. Fui para a Califórnia, porque adoro viver como estrangeiro: isso o obriga a escutar, a ganhar o direito de morar ali.
LV - E o que fez lá? Levy - Desenho gráfico. Tinha 24 anos e montei uma pequena empresa de desenho gráfico... Sete anos depois, fali. E voltei a Paris.
LV - Então começou a escrever. Levy - Não. Meu filho tinha nascido e eu precisava trabalhar. Não tinha um centavo mas tinha uma caixa de ferramentas: me meti a técnico de iluminação.
LV - E se deu bem? Levy - Sim, tenho habilidade manual. Criei com um amigo uma pequena empresa. E nove anos depois, em 2000, era um escritório com 80 arquitetos. Sim, foi divertido...
LV - Então deduzo que já o deixou... Levy - Sim, depois do sucesso de meu primeiro romance, "E se Fosse Verdade", em 2001.
LV - O que o levou a escrevê-lo? Levy - Durante as reuniões na empresa eu escrevia um fragmento de conto que naquela noite contaria a meu filho. Até que um dia ele preferiu ver televisão...
LV - Não diga! Levy - Mas decidi continuar. Escrevi algo para que Louis lesse quando fosse mais velho! E escrevi esse romance, que guardei numa caixa.
LV - Não quis publicá-lo? Levy - Mas minha irmã o leu, gostou e o mandou para uma editora. Chamaram-me para publicá-lo: eu pensei que era brincadeira...
LV - Ficou surpreso. Levy - Sim, e houve mais surpresas: na Feira de Frankfurt, antes que o romance fosse editado... Steven Spielberg comprou os direitos para fazer um filme! Quando Spielberg me telefonou, pensei: "Estou sonhando". Ele marcou uma entrevista em seu escritório e viajei para a Califórnia...
LV - De novo. Mas dessa vez era diferente! Levy - Sim. Dessas conversas saiu o filme "Just Like Heaven" [E Se Fosse Verdade] (que estréia no Brasil em dezembro), dirigido por Mark Waters.
LV - Que história contava a seu filho? Levy - Um homem encontra uma mulher trancada no armário de seu banheiro. Ela lhe explica que teve um acidente de carro e que faz seis meses que seu corpo está em coma num hospital... Ele pensa que ela é louca...
LV - Lógico: uma transtornada... Levy - Mas logo mudará de opinião! Só ele pode vê-la... É a história de um homem que se apaixona pela carta e não pelo envelope...
LV - Você tem vivências sobrenaturais? Levy - Sim. Me apaixonei!
LV - Quando se apaixona, pelo que se apaixona? Levy - Ah, que mistério. Se alguém tivesse essa receita, venderia mais livros que a Bíblia!
LV - Você não pode se queixar... Levy - Não. Publiquei cinco romances nesses cinco anos e agradaram muito... Transformaram em leitores pessoas que não costumavam ler.
LV - E o que disseram os críticos? Levy - Os críticos franceses sempre se queixam de que as pessoas não lêem, mas quando há muitos leitores... têm medo e também se queixam!
LV - O menosprezam como escritor? Levy - Sim. Para me criticar, acusam-me de que mais mulheres que homens me lêem. Que mentalidade medieval! As mulheres são leitores de segunda? Me honra ter muitas leitoras! Como homem, deveria ser mais fácil para mim conectar-me com os sentimentos dos homens, não?
LV - Isso prova que é um bom escritor? Levy - Eu sou um autor. Outorgar-se a si mesmo o título de escritor... que pretensioso! Só os leitores, com os anos, podem lhe dar o título.
LV - O que acredita que os leitores buscam? Levy - Ser abduzidos de sua rotina, viver algo através de um personagem: ser outro por um momento.
LV - Seu pai também lhe contava histórias? Levy - Meus pais me iluminam com o amor que têm um pelo outro há 45 anos. E o que meu pai me explicou é isto, o essencial: "O amor e o ego lutam para ocupar o trono do cérebro". Para seu bem, que ganhe o humor!
LV - E como ajudar o humor para que ganhe? Levy - Ria de si mesmo sempre um pouco mais do que ri dos outros. E ponha os outros no centro de sua vida, não você mesmo!
LV - Não é fácil... Aplica essa máxima a si mesmo? Levy - Se eu digo "sou um escritor", me coloco no centro: ganha o ego. Se digo "só pretendo escrever histórias para as pessoas", ponho os outros no centro e derroto o ego!
LV - Alguma vez o ego saiu vencedor? Levy - Hummm... sim, uma vez.
LV - Pode me contar? Levy - Trabalhei na Cruz Vermelha, e entrou no pronto-socorro uma mulher com parada cardíaca. Não conseguíamos reanimá-la. Eu insisti. "Deixe, não há o que fazer", me disseram. Continuei e seu coração voltou a bater! Deixei o emprego na semana seguinte.
LV - Por quê? Deve ter sentido uma grande alegria! Levy - Durante um momento senti algo que... Estava recebendo mais do que dava! E eu não estava ali para isso. Não, não... o ego se impunha. Fui embora.